& Moira Bianchi: Persuasão: 4 símbolos

terça-feira, 16 de agosto de 2022

Persuasão: 4 símbolos

olá,

Persusão é uma obra tão rica que eu juntei pesquisa demais para resolver em poucos posts. Ainda tenho muito para postar e ontem, do nada, descubro um segredinho sujo que Jane Austen escondeu de nós!

Young woman with letter - Lionel Baes . Wikicommons

capítulo 12 - logo depois do acidente de Louisa

"A essa altura, a notícia do acidente já havia se espalhado entre os operários e barqueiros ao redor do Cobb, e muitos se aproximaram para serem úteis se pudessem, e pelo menos, apreciar a visão de uma jovem inerte, ou melhor, duas mocinhas inertes, pois isso provou ser duas vezes melhor do que o primeiro relatório. 

Foi decidido que Henrietta era a mais bonita, pois, embora parcialmente recomposta, ela estava bastante indefesa."

pinterest

Percebe o erotismo vindo da submissão feminina?

Eu nunca tinha reparado antes...

Enfim, vamos continuar investigando e aprendendo sobre a última obra que Austen concluiu.

4 Símbolos em Persuasão

~ uma interpretação ~

Woman at piano with cockatoo - Gustave Léonard - 1870

Música

No jantar na Great House em Upercross, enquanto todos dançam, Anne fica em segundo plano. Ocupada e útil, ela toca para dar fundo à diversão dos outros ao invés de dançar e socializar. A música, portanto, representa a solidão de Anne Elliot e reflete seu relacionamento com o capitão Wentworth. 

Veja: capítulo 8. "Anne sofre silenciosamente vendo Wentworth ser banhado na atenção das moças mais jovens “... enquanto seus dedos trabalhavam mecanicamente, tocando por meia hora, igualmente sem erro e sem consciência. Uma vez ela sentiu que ele estava olhando na sua direção, observando suas feições alteradas, talvez, tentando traçar nelas as ruínas do rosto que outrora o encantara; e uma vez ela soube que ele devia ter falado dela; ela mal se deu conta disso, até que ouviu a resposta; então ela teve certeza de que ele havia perguntado à sua parceira se a srta. Elliot nunca dançava? A resposta foi: 

―Oh, não; nunca; ela desistiu de dançar. Ela prefere tocar. Ela nunca se cansa de tocar.”

Assim, ela criou para si um mundo à parte da vida social dos outros, observando os prazeres deles e negando os seus, relegada no canto e sentindo-se diminuída na presença de seu antigo amor que fazia questão de se divertir sendo o centro das atenções das meninas jovens na flor da beleza feminina. O capítulo termina assim:

“Anne não desejava mais desses olhares e discursos (meticulosamente polidos vindos do Capt Wentworth). Sua fria polidez, sua graça cerimoniosa, eram piores que tudo.”

buzzfeed

Ao mesmo tempo, a música representa sua devoção por Wentworth, quase como uma viúva de guerra. Ao se isolar, ela reserva seu coração para ele, e a música, uma alegria comum deles, é uma forma de ela se lembrar do amor que compartilharam uma vez.

Mais tarde no romance, no entanto, a música os une novamente, mesmo que ainda não permanentemente. O encontro deles no concerto no Capítulo 20 é um ponto de virada na história, pois é a música que encoraja Anne a participar do evento e conversar com o Capitão Wentworth. Veja:

“Sir Walter, suas duas filhas e a sra. Clay foram os primeiros de todo o grupo no salão à noite; e como Lady Dalrymple devia ser esperada, eles se posicionaram perto de uma das lareiras na Sala Octogonal. Mas mal eles se acomodaram, a porta se abriu novamente, e o Capitão Wentworth entrou sozinho. Anne era a mais próxima dele e, avançando um pouco, ela imediatamente cumprimentá-lo. Ele estava se preparando para fazer a reverência apenas e seguir em frente, mas o gentil ‘―Como tem passado?’ o fez parar perto dela e conversar educadamente, apesar de seu pai e irmã estarem logo atrás.”

Eles conversam por mais de 3 páginas e comentam da união de Louisa com o Capt Benwick deixando claro que ele nunca teve nenhum (real) interesse na mocinha (apesar de fazer ciúme em Anne por capítulos e capítulos).

Woman in the boat with Parasol (the white parasol) - Edward Cucuel

Navios

CARREIRA & FORTUNA

Navios simbolizam as vidas e destino de vários personagens do romance. 

Para o capitão Wentworth e o almirante Croft, os navios representam seu sustento na forma de carreira na Marinha Real, cercados de riscos e recompensas cercadas de aventuras viris. Ambos falam de navios romanticamente — e com reverência. Quando Wentworth se lembra do Asp, seu diálogo se torna intenso e emocional no Capítulo 8: "Ela fez tudo o que eu queria. Eu sabia que ela faria." 

Como na língua Inglesa, navios são tratados no feminino, essa declaração dele é como se falasse de uma mulher, uma amante. Parece que a tentativa de provocar ciúmes em Anne que ouve o relato que ele faz de suas aventuras no velho navio Asp em silêncio e apavorada pelos riscos que ele passou.

MOBILIDADE SOCIAL

Os navios e a carreira no mar indicam mobilidade ascendente e heroísmo

O capitão Wentworth comandou um navio e liderou seus homens durante a guerra, o que lhe trouxe status e fortuna, tornando-o um partido melhor aos olhos de seus conhecidos mais ricos (Lady Russel e os Elliots, por exemplo). 

A carreira militar era uma ótima opção de ascenção social para homens, especialmente em tempos de guerra. Observando seus irmãos, Austen teria tido plena consciência de que o avanço na marinha não era apenas uma questão de mérito

No caso de Wentworth, ele ganha sua fortuna capturando navios. Uma vez sob sua posse, ele (como qualquer outro oficial graduado) poderia se apropriar da embarcação, sua tripulação e bens. Além claro, do valor dos seguros. A marinha aproveitava das leis de pirataria e da companhia de privateers (corsários) na sua frota. No jantar em Upercross ele fala disso:

“...e depois de pegar corsários o suficiente para ser muito divertido, tive a sorte de, na minha vinda para casa no outono seguinte, encontrar na fragata francesa que eu queria. Eu a trouxe para Plymouth; e aqui tive outro exemplo de sorte.”

INSEGURANÇA & MEDO

Da associação de Anne com o capitão Wentworth, ela tem conhecimento da marinha, e seu interesse contínuo reflete seu amor por ele apesar de ter consciência de que a vida no mar é incerta e cheia de perigos. Para ela, os navios representam arrependimento e medo pela segurança dele – tanto quando o ouve contar das conquistas como depois de casarem.

FELICIDADE MARITAL

Os navios servem como símbolo do casamento feliz dos Croft, pois a Sra. Croft acompanha o marido em longas viagens. Essa possiblidade faz Anne sonhar com uma vida assim colorida bem distante da mesmice triste que ela vive como moça solteira na casa do pai.

A summer beauty - English School - século 19

Baronetage

O romance começa com Sir Walter com o nariz em um livro: o Baronetage é o único livro que ele lê, basicamente um livro de referência que cataloga essas estranhas criaturas, a nobreza britânica. Veja aqui.

A obsessão de Sir Walter com seu próprio verbete no Baronetage é o equivalente a uma subcelebridade que escreve para si mesma na Wikipédia. O Baronetage simboliza a posição na sociedade que Sir Walter detém e que sua opinião sobre sua importância é maior do que o registro oficial faz.

Seu gosto pelo livro já foi compartilhado por Elizabeth, que também compartilha sua obsessão com a posição, mas não mais porque o livro coloca seu status de solteira em preto e branco e a lembra que falha no que a sociedade dita ser seu principal objetivo na vida: casar com alguém que também está no Baronetage. Elizabeth vê o livro como símbolo de sua própria inadequação mesmo que seja prova de seu status social. 

Interior of drawing room at Wavedon - British school, 1840

Kellynch Hall

Kellynch Hall é mais do que apenas uma casa realmente grande: é a casa mais grandiosa da região, porque pertence à família mais importante da região, os Elliots. A única outra pessoa titulada da vizinhança, Lady Russell, mora em Kellynch Lodge, mostrando a hierarquia social e o tamanho da propriedade

E posição social significa mais do que apenas quem entra em uma sala primeiro: significa poder, e Kellynch Hall é um símbolo desse poder. 

De acordo com os velhos costumes feudais, Kellynch é o centro e seus proprietários devem ser responsáveis pelo bem-estar de seu entorno e formar um exemplo moral para todos os outros. Austen já tinha falado disso em Orgulho e Preconceito quando a governanta de Pemberley conta como Mr. Darcy é um senhor piedoso e justo; e ao apresentar Lady Catherine como um tipo de juíza da região de Rosings.

O fracasso dos Elliots em viver de acordo com esses padrões é mais do que decadência individual: eles estão falhando com todos que deveriam ser capazes de seguir sua liderança – sabemos disso porque a humilde Anne que fica presa ao dever de "ir a quase todas as casas da paróquia, como uma espécie de despedida" cap 5. E o fato de serem forçados a sair de Kellynch Hall, e ter que arrendar para os Crofts que não são nobres, simboliza uma mudança social maior em quem está ganhando poder e quem está perdendo. Se essa mudança está destruindo tradições ou trazendo algo novo e melhor é, no entanto, uma questão que Austen em aberto. 


fonte: meus arquivos pessoais, study.com, schmoop, reddit, spark notes, Jane Austen and Animals, wikipedia


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